Enquanto isso, a relação não apresentava grandes dificuldades. Estavam quase morando juntos. A fase dos beijinhos tinha ficado no passado. Era hora de definir o futuro. Diante do perigo, providências enérgicas foram tomadas
Ele tinha 25 anos e estava apaixonado. Mas não era apenas o amor. Era muito mais. Uma paixão violenta, um turbilhão, uma tempestade. Algo que ultrapassava todas as definições, todos os adjetivos e substantivos. Era o seu ritual de passagem — a vida dividida entre o antes e o depois.
É claro que a família não pensava assim. Quase todos torciam o nariz para aquela relação, no mínimo, escandalosa. Onde é que já se viu uma coisa dessas?, perguntava a irmã mais nova. A outra irmã se equilibrava no meio da confusão – algumas vezes concordando com o pessoal; outras, apoiando o romance do mano. “Não liga pra essa gente besta, cara! Vai fundo!”, aconselhava baixinho. E, no momento em que aparecia alguém, mudava rapidamente de assunto.
A destruidora de corações tinha quase quarenta anos. Era alta, elegante, educada e com algum dinheiro. Pouco, é verdade. Mas, perto daquela família, parecia rica. Aliás, muito rica. E isso, de certa forma, justificava toda a resistência.
A mãe não deixava por menos e se referia à namorada do filho como “aquela piranha”. E previa: “Isso vai ser o fim do meu menino. Escrevam o que estou dizendo: essa ‘zinha’ vai acabar com o meu filho!” Em seguida, caía em prantos. Chorava umas duas Cataratas do Iguaçu. Semicatatônica, parecia exigir providências enérgicas contra o descalabro.
Enquanto isso, a relação não apresentava grandes dificuldades. Estavam quase morando juntos. A fase dos beijinhos tinha ficado no passado. Era hora de definir o futuro. Diante do perigo, providências enérgicas foram tomadas. E coube ao pai resgatar o filho desgarrado. Com a conversa mole de sempre, e constrangido pelo inusitado da situação, o “velho” tentou explicar para o rapaz que a diferença de idade é sempre um problema — ou melhor... Mas, não completou a frase. Depois de um silêncio incomodo, disse, pausadamente: “Quer saber de uma coisa? Todos os relacionamentos emocionais são problemáticos. Deveriam vir com manual de instrução. Só assim talvez errássemos um pouco menos.” Olhando fixamente para o filho, terminou a conversa: “Você sabe, só estou aqui porque tua mãe pediu. Se não falo com você, ela me mata!”
O filho abraçou o pai. Disse uma bobagem qualquer e o convidou para tomar uma cerveja no bar da esquina.
No dia seguinte, arrumou as malas e foi embora. Deixou um bilhete dizendo que “as melhores coisas da vida simplesmente acontecem. Não podemos evitar. O que talvez possamos escolher são as coisas ruins”. No post-scriptum, lembrou à mãe que se a namorada estava na idade da loba, ele estava pronto para ser devorado.
Texto: Raul Arruda Filho
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